quinta-feira, 26 de julho de 2012

“Avenida Brasil”: João Emanuel Carneiro, em sua segunda novela no horário nobre, já faz auto referência à sua obra anterior, recurso usado por novelistas veteranos



João Emanuel Carneiro bebeu na fonte de outros grandes autores, como Aguinaldo Silva e Gilberto Braga, no capítulo dessa quarta-feira (25) de “Avenida Brasil”. Na cena em que Nina (Débora Falabella) está escrachando em cima de Carminha (Adriana Esteves), o celular da patroa toca e o som é o tango eletrônico do conjunto argentino Bafondo, mesma música usada na abertura de “A Favorita”, também de João Emanuel. Curioso é que na novela exibida em 2008, as protagonistas, as arqui-inimigas Flora (Patrícia Pilar) e Donatela (Claudia Raia), também deixavam o público em dúvida sobre qual delas era a maior vilã. Encaixou bem no embate entre Nina e Carminha. 

Esse recurso de um autor fazer referência de suas obras antigas em tramas atuais já é usado há muito tempo. Recentemente, em “Fina Estampa”, de 2011, Aguinaldo Silva reviveu uma cena de Renata Sorrah em “Senhora do Destino, quando Tereza Cristina (Christiane Torloni) mata um mafioso, uma de suas vítimas, empurrando-o escada abaixo, e ainda solta a frase: “Obrigada, Nazaré Tedesco”!”, referindo-se à vilã da novela do mesmo autor, que foi ao ar em 2004.  


Ainda em “Fina Estampa”, Eva Wilma fez uma participação especialíssima como Tia Íris, que tinha o mesmo perfil da Altina que ela interpretou em “A Indomada”, também de Aguinaldo. Não bastasse as expressões em inglês, como o famoso “Of course”, no último capítulo Tia Íris e sua companheira Alice (Thaís de Campos), que se tornaram caminhoneiras, ao irem embora encontram pela frente vária opções de destinos, todas referentes a cidades onde foram ambientadas novelas anteriores do autor: Asa Branca (“Roque Santeiro”), Santana do Agreste (“Tieta”), Resplendor (“Pedra Sobre Pedra”), Tubiacanga (“Fera Ferida”) e Greenville (“A Indomada”).

Em “Insensato Coração”, de 2011, logo de cara se percebeu que o nome CTA da empresa aérea em que Pedro (Eriberto Leão) trabalhava era um jogo das letras TCA, empresa aérea de “Vale Tudo”, grande sucesso de 1988, também de Gilberto Braga. O autor ainda prestou várias homenagens atores que fizeram parte do elenco de suas novelas. Como em uma cena em que Horácio Cortez (Herson Capri) apareceu falando ao telefone com Marion Novaes, que nunca tinha aparecido na história, mas tratava-se da perua decadente vivida por Vera Holtz em “Paraíso Tropical”, de 2007.

E o que dizer das Helenas que encabeçam todas as novelas de Manoel Carlos desde “Baila Comigo”, de 1981? É claro que aí não se trata de uma auto referência propriamente dita, mas sim numa repetição de nomes. Mas em “Mulheres Apaixonadas”, de 2003, quando Christiane Torloni era a Helena da vez, e, como todas, cheia de defeitos e qualidades, a personagem afirmou: “As Helenas sofrem, mas dão a volta por cima”. Não deixou de ser uma fala autorreferente.

A questão não é puramente aplaudir ou condenar. A questão é avaliar se o recurso foi usado na medida certa, dentro de um contexto apropriado e sem se sobressair ao momento da história em que foi inserido. Uma coisa é um toque de celular de poucos segundos, outra coisa é a repetição exaustiva de mais do mesmo que acabe cansando um público mais exigente.Nesses casos vale sempre o velho e bom senso que ensina: o menos é mais. E a medida certa é melhor ainda.