Independentemente do mistério em torno do real
caráter de Nina (Débora Falabella) em “Avenida Brasil”, nos primeiros capítulos
da novela de João Emanuel Carneiro já se pode ver que a personagem, então
chamada de Rita (Mel Maia), odiava a mulher que ocupou o lugar de sua verdadeira mãe. E, não bastando ter perdido o
pai biológico na infância, quando jovem viu o adotivo morrer a seu lado.
Pronto, abriu-se aí muitos atalhos para o autor enveredar pelos mais
instigantes caminhos da mente dessa personagem que disfarça o tom de ironia ao
chamar Lucinda (Vera Holtz) de “mãe”, e carrega no deboche ao tratar Nilo (José
de Abreu) como “paizinho”. Se for feita uma comparação, Nina certamente não é
nenhuma Branca de Neve que ficaria feliz apenas por ter encontrado seu
príncipe, no caso Jorginho (Cauã Reymond). Ela quer mesmo é ver a madrasta má Carminha
(Adriana Esteves) se empanturrar de muitas maçãs envenenadas.
Carminha, por sua vez, é a madrasta má que não
contém as lágrimas ao ouvir falar sobre sua mãe morta, como aconteceu durante uma
das sessões de tortura psicológica que sofreu de Nina. Só que essa pequena
demonstração de carência maternal se perde em meio a um conjunto de atitudes. Carminha
não é maquiavélica apenas como madrasta, ela também é diabólica como mãe,
humilhando e magoando constantemente a pequena Agatha (Ana Karolina). Imagino
que personagem riquíssima de nuances psicológicas Agatha não se transformará
quando ficar adulta e tiver consciência de tudo que se passou à sua volta vivendo
na Mansão Tufão de loucos.
Em tom de comédia, mas nem por isso deixando o lado
emocional também se manifestar, “Cheias de Charme” traz protagonistas órfãs com
históricos de sobrevivência distintos. Cida (Isabelle Drummond) é a mais fiel
versão moderna da Gata Borralheira. Foi criada pelos Sarmento como a empregada órfã
dos antigos motorista e doméstica da casa. Humilhada por todos, por um acaso do
destino torna-se cantora de sucesso. Só então seu verdadeiro pai biológico se
revela, é o ex-patrão Ernani (Tato Gabus Mendes). Sem tempo para esperar
sapatinho de cristal, Cida vira uma Cinderela às avessas. Ela não se preocupa
em questionar o que seus verdadeiros pais passaram, parte logo para a vingança
contra os Sarmentos pensando unicamente no que ela passou nas mãos deles.
Na mesma novela, escrita por Izabel de Oliveira e
Filipe Miguez, as outras duas Empreguetes, Rosário (Leandra Leal) e Penha (Taís
Araújo), têm uma realidade um pouco mais longe dos contos de fadas. Rosário foi
retirada de um orfanato e adotada por Sidney (Daniel Dantas) quando tinha 10
anos. O sonho de ser uma cantora famosa foi alimentado pelo pai adotivo, um homossexual
nostálgico que ouve discos vinil de Ângela Maria e outros artistas da época. Até
o momento, não foi feita qualquer referência a seus pais biológicos. Nem ela
parece preocupada com isso. Focada na realidade, seu estrelato no mundo das
celebridades está em primeiro lugar, se sobrepondo até mesmo ao amor de Inácio
(Ricardo Tozzi).
Já Penha pode ser considerada órfã de pais porque
ninguém sabe se estão vivos. Ambos abandonaram a família muito cedo, nunca mais
apareceram e ela se encarregou de criar e sustentar sozinha os dois irmãos mais
novos, trabalhando como doméstica. Casou-se e separou-se de um malandro, Sandro
(Marcos Palmeira), com quem tem um filho, Patrick (Nicolas Paixão). Percebe-se
que por ter assumido o papel de pai e mãe dos irmãos, Penha sabe o valor que
essas figuras representam e acaba relevando muitas falcatruas de Sandro para
poupar o próprio filho que tanto se orgulha do pai. Está mais para a Dama e o
Vagabundo.
O representante masculino entre protagonistas órfãos
é Rodrigo (Gabriel Braga Nunes), de “Amor Eterno Amor”, de Elizabeth Jhin. Como o horário pede, a
leveza e o tom lúdico dominam sua história. Rodrigo foi sequestrado quando
criança de pais milionários no Rio de Janeiro e criado na pobreza por outros “pais”
no interior de Minas Gerais. Localizado já adulto pela verdadeira mãe, Verbena
(Ana Lucia Torres), que está à beira da morte, vai para o Rio de Janeiro, onde muda
o rumo de sua história.