quinta-feira, 19 de abril de 2012

“Cheias de Charme”: Cláudia Abreu é a dona da novela que mostra como brega vira moda e cafona se disfarça de cult


Cláudia Abreu não está surpreendendo em “Cheias de Charme”, está apenas confirmando o que os conhecedores de sua trajetória já sabiam: é uma atriz que basta entregar-lhe nas mãos os ingredientes e ela transforma qualquer receita de que personagem for em um manjar dos deuses. Na novela das sete que estreou segunda-feira (16), na Globo, a atriz simplesmente tomou para si o domínio da história logo na sua primeira cena no papel da cantora brega Chayene. Ao lado de Luiz Henrique Nogueira, seu assistente Laércio, e Bruno Mazzeo, o empresário Tom Bastos, ela forma um trio que já deu sinais de que poderia protagonizar um seriado independentemente de estar embutido em uma novela.

“Cheias de Charme”, uma trama de Filipe Miguez e Izabel de Oliveira, com supervisão de Ricardo Linhares, e direção de Allan Fiterman, Maria de Médicis e Natália Grimberg, com direção geral de Carlos Araújo e direção de núcleo de Denise Saraceni, gira em torno das aventuras e desventuras de três jovens ligadas por fazerem trabalhos domésticos, levadas a essa função por diferentes necessidades. Maria da Penha (Taís Araújo), que mora numa favela e precisa sustentar marido, filho e irmão, Maria do Rosário (Leandra Leal), que trabalha com o pai num bufê, mas sonha ser cantora famosa, e Maria Aparecida (Isabelle Dummond), jovem que perdeu os pais cedo e é criada pelos ricos patrões, mas não deixa de ser tratada como serviçal.

Logo no primeiro capítulo, Penha, Rosário e Cida se veem envolvidas em confusões particulares que as levam a uma delegacia de polícia. É la que as três se conhecem e firmam o pacto de mudarem de vida: “Hoje empreguete, amanhã madame”. Lembrou um pouco o começo de “Quatro por Quatro”, de Carlos Lombardi, na qual o quarteto formado por Betty Lago, Elizabete Savalla, Cristiana Oliveira e Letícia Spiller se uniram, também numa cela de uma delegacia, jurando vingança contra seus ex. A história pode ser outra, mas a situação foi parecida. E, embora agora fossem três mulheres, Cláudia Abreu se encarregou de se transformar no quarto elemento.

Para fazer frente a uma Chayene, só uma Leandra Leal. A atriz de apenas 29 anos, 20 dos quais atuando, dispensa qualquer comentário depois de ser premiada em produções ao lado de grandes nomes não só da TV quanto do cinema e do teatro. Leandra tem carisma próprio e consegue transmitir através do olhar, do sorriso e até das lágrimas de Rosário uma mensagem de que é possível, sim, ter sonhos. Se eles vão se realizar é outra história. E através dela será avaliado o amor pela fama e o amor pelo amor, já que seu ídolo é Fabian, mas também surge em seu caminho o motorista Inácio, ambos interpretado por Ricardo Tozzi.

Tozzi, o ator, que fez graça como o Douglas de “Insensato Coração”, agora tem a oportunidade de realmente mostrar seu valor em dois papéis controversos. Um deles é o cantor popular, inspirado em Odair José, considerado o ídolo das empregadas domésticas nos anos 70. Nas cenas dos shows, o ator é dublado por Juliano Cortuah, que participou do reality “Fama” há dez anos. O segundo personagem é o contido e misterioso Inácio, que se emprega como motorista do bufê onde Rosário trabalhava e se apaixona pela moça após salvá-la de um incêndio. Com certeza será um dos maiores desafios do ator.

Voltando às protagonistas, Isabelle Drummond, com apenas 18 anos e já contabilizando mais de dez de carreira, sendo seis só como a boneca Emília do remake do “Sítio do Picapau Amarelo”, está perfeitamente encaixada no papel de Cida, a mocinha ingênua, sonhadora, romântica e boazinha. Mas precisa ficar atenta a conselhos que a própria Regina Duarte, a eterna Namoradinha do Brasil, já deu quando avisou: “Não é fácil fazer a mocinha”. Se Isabelle não der a Cida um up que a diferencie de tantas outras mocinhas românticas que já existiram, corre o risco de acabar se tornando apenas mais uma "eterna Narizinho", como aconteceu com Rosana Garcia.

Taís Araújo também vai ter trabalho para sua Penha não ser engolida por Chayene e Rosário, respectivamente a sua ex-patroa e a amiga e substituta na casa da cantora de tecnobrega. Em alguns momentos, a atriz exagera nos trejeitos para interpretar uma moradora da comunidade e faz até lembrar os olhares, trejeitos e sacolejos de “Xica da Silva”, sua primeira protagonista na extinta Rede Manchete. Sem falar que sua realidade, que é mostrada como a mais difícil das três, parece ser uma festa constante, com linguiça assada sendo servida na laje para os amigos a toda hora. E o que dizer de Marcos Palmeira fazendo o marido malandro, endividado e inexpressivo Sandro? Torço para que o personagem dê uma volta por cima, ou não se justificará o ator que já foi o galã da história perder o cargo para outros sem um terço da sua capacidade. Tudo bem não ser o galã. José Mayer fez isso recentemente em “Fina Estampa”. Mas o Pereirinha, com seu visual e comportamento, teve a importância à altura de um galã. Seja lá qual fosse a história escrita para ele.

Para um horário que não tem tradição de tratar temas sérios, “Cheias de Charme” está cumprindo sua missão de entreter, com algumas tramas que fingem ser dramáticas, mas se mostram cômicas. Incomoda um pouco a repetição no elenco. Malu Galli, que acabou de sair do ar como a Dora de “A Vida da Gente”, já está de volta fazendo Lygia. A abertura feita em animação está divertida e bem feita, mas vindo logo após “Amor Eterno Amor”, que já está no ar há mais tempo tendo uma abertura no mesmo estilo, soa como uma saturação do recurso. De qualquer forma, “Ex My Love” como trilha se encarrega de fazer a diferença.