Já há algum tempo as novelas classificadas como de
época vêm surpreendendo por uma qualidade não apenas em termos de produção artística
como também por trazerem uma agilidade no texto e um ritmo acelerado nos
acontecimentos que superam de longe certas histórias ambientadas nos dias
atuais. Pode até parecer contraditório uma trama cuja locomoção das personagens
são carroças que percorriam longas distâncias entre fazendas e vilarejos, ou
bondes em cidades que ainda engatinhavam em busca do progresso, ser mais “movimentada”
do que outra que tem a seu alcance meios de transportes modernos como carros, helicópteros,
aviões.
Mas, é o que está acontecendo novamente. Basta
pararmos para analisar duas novelas que estrearam recentemente e exatamente na
mesma data, há 18 dias, e que são ambientadas em séculos totalmente diferentes:
“Escrava Mãe”, da Rede Record, e “Haja Coração”, da Rede Globo. A diferença
mais gritante entre ambas é o fato de a primeira ser um drama romântico que se
passa no século XVIII, e a segunda uma comédia romântica do século XXI. E é
justamente aí que está a razão da comparação. Afinal, tem-se na maioria das
vezes a ideia de que um drama do passado pode parecer um tanto quanto enfadonho
diante de uma comédia moderna. O romance entraria apenas como um aposto.
Só que para o telespectador o que conta não é o século
ou o ano em que a história se passa, mas sim que ela seja contada seguindo o
ritmo do tempo em que ele próprio está vivendo. Sendo assim, a dificuldade em
escrever não é maior ou menor para os autores de um gênero ou outro. Todos
devem ter o mesmo cuidado em não apenas criar diálogos bem construídos, mas também
imprimir neles o máximo de informações que sirvam para desencadear novas ações.
Talvez seja aí que aparentemente vemos acontecer um certo comodismo quando se
trata de um enredo passado nos dias atuais, enquanto o folhetim que traz
emblemas históricos corre na frente, pesquisando, ensaiando, na ânsia de fugir
de se tornar arrastado ou didático ao extremo.
Em apenas 15 capítulos, exibida de segunda a
sexta-feira, às 19h30, os acontecimentos de “Escrava Mãe” se sucederam numa
velocidade digna de minissérie. E não é que os fatos tenham se atropelado, pelo
contrário, estão seguindo uma trajetória lógica e sendo todos bem elucidados no
momento em que ocorrem. Os autores nem se valeram da possibilidade de
reutilizarem a batida fórmula do “Quem matou?”, por ocasião da morte do Coronel
Genuíno (Antônio Petrin). Um capítulo após o da morte já foi revelado que a
assassina é sua filha, Maria Izabel (Thaís Fersoza). E nem por isso acabou o
suspense, porque os outros suspenses não estão, necessariamente, diretamente ligados a esse assassinato. Até porque em todos os núcleos há mistérios a serem revelados e as
pistas mudam de um capítulo para o outro. Talvez esteja aí o maior feito dos
realizadores: deixarem telespectadores dos novos tempos intrigados sobre o que
acontecerá na cena seguinte de uma novela de época.
O mesmo não acontece em “Haja Coração” que, com dois
capítulos à frente no ar, por ser exibida também aos sábados, parece estar um
passo atrás em termos de criar expectativa para as próximas cenas. Não bastasse
os acontecimentos serem sempre previsíveis, as situações se repetem e os
diálogos nada acrescentam, pecando pelo excesso de descrição do cotidiano nas
relações. Não justifica ser uma história baseada em outra que se passou há
décadas o fato de se perder em um moderno pincelado de um conservadorismo e de
uma visão bairrista contestados no mundo atual. Já está esgotada essa fórmula
de usar aberrações comportamentais de homens que buscam a ascensão casando-se com
mulheres feias, autoritárias e ricas, e de mulheres que mesmo tendo gênio forte
e dizerem-se independentes só se realizarem se encontrar o príncipe dos sonhos.
Até mesmo o que deveria ser o mistério central da história está perdido em meio
a um festival de gracinhas sem graça e péssimos, cansativos e irritantes exemplos
de erros de português divulgados através de Tancinha (Mariana Ximenes). O viés de
“Sassaricando” poderia até ser reaproveitado, mas precisaria ser costurado de
outra forma para não virar mais uma peça de figurino obsoleta, repetitiva e
cheirando a naftalina.
Mais novelas de época em:
http://tvindependentebyelenacorrea.blogspot.com.br/2016/01/alem-do-tempo-mensagem-no-final-do.html