Há tempos, quando terminava de assistir ao último
capítulo de algumas novelas a primeira coisa que me vinha à mente era a frase de
um diretor americano de cinema: “Não importa se a uma hora e meia inicial da
história for ruim, se a meia hora restante for excelente vai ser considerado
bom, ou até ótimo, porque será sobre as cenas finais que o público sairá do
cinema comentando”. Em televisão essa teoria cairia por terra e a recíproca não
seria verdadeira, nem mesmo tentando um “e vice-versa”, porque o telespectador não
precisa trocar de sala se não for logo fisgado pela trama, basta mudar o canal
e redirecionar sua audiência. Mas não foi essa frase que me veio à mente nessa
sexta-feira (25), após assistir ao último capítulo de “Verdades Secretas”,
novela das onze da Rede Globo. Porque, definitivamente, há tempos a telenovela,
um dos principais, senão o principal produto da televisão brasileira, carece de
histórias que realmente apresentem conteúdos que estejam à altura do grau de
exigência do público. E aí não adianta vir com desculpa de horário ingrato,
concorrência de TV por assinatura, internet e outras válvulas de escape. Quando
o produto é bom, noveleiro compra e consome a qualquer hora, em qualquer lugar.
“Verdades Secretas” não foi um produto que se
sobressaiu apenas por ser bom em tempos de carência de outros melhores na faixa
nobre da emissora. Simplesmente se sobressaiu por, graças ao autor Walcyr
Carrasco, a direção geral de Mauro Mendonça Filho, a um elenco que foi
escolhido em algum momento em que o universo conspirou para que fosse o melhor,
e à retaguarda de uma equipe que, na soma total, ofereceu aquilo que o
público realmente quer ver: drama no limite suportável, sexo no limite
aceitável, humor sarcasticamente inteligente, e uma ficção verdadeira, mas pontuada
secretamente de uma realidade que mexeu com o imaginário.
Aliada à criação do autor está a direção primorosa de
Mauro Mendonça Filho, além do trabalho irrepreensível de figurino, cenografia, iluminação,
figurino, maquiagem e caracterização. É inegável a superação de Grazi Massafera
que, após algumas tentativas infrutíferas de emplacar como atriz, conseguiu dar
a volta por cima e vencer o desafio de interpretar Larissa, uma modelo que faz
um voo sem escala da prostituição glamourosa ao mundo decadente das drogas. Mas deve-se destacar
também o trabalho impecável realizado pela equipe de caracterização que, com
certeza, teve boa parcela de “participação” no sucesso da personagem. Assim como
Rainer Cadete, que passou por uma verdadeira transformação após ter feito um
médico sério na novela “Amor À Vida”, em 2013, reapareceu irreconhecível e, explorando
um lado mais leve por aparentemente dar a ideia de ser mais divertido, teve seu
momento único como a “libélula” Visky.
Ainda sobre superações, Camila Queiroz fez sua
estreia de atriz já como protagonista, desfilando pelo vídeo com uma
segurança como se tivesse tantos anos de televisão quanto tem de passarela. A
jovem simplesmente conseguiu seguir à risca a expertise do autor e ludibriar
não só os demais personagens da história como também o próprio público até os
momentos finais do último capítulo. Foi seu olhar demoníaco, toda pura vestida
de noiva, que revelou a “dupla identidade” da Arletinha-Angel, que sempre
esteve mais para anjo mau.
Mas, mesmo a novela tendo fechado com chave-de-ouro,
ainda acho que o penúltimo capítulo que realmente foi de tirar o fôlego da
primeira à última cena. Foi quando os anos de estrada, a experiência e o
talento falaram mais alto. Como não se comover ao ver Eva Wilma no papel da alcoólatra
dona Fábia agarrada a uma garrafa de whisky na janela de seu quarto numa
clínica para idosos, tentando ainda se conformar com o fato de estar viva
porque agora tinha a presença de seu “namorado escocês”? E Drica Moraes, no
auge do ponto nevrálgico em torno do qual girou toda a história, com sua
Carolina, que parece ter sido batizada com esse nome por causa da letra da
música de Chico Buarque: “Carolina, nos seus olhos fundos, guarda tanta dor, a
dor de todo esse mundo...”? A atriz deu todas as diretrizes da trama no
primeiro capítulo interpretando a mulher que acabava de descobrir a traição
de seu primeiro marido, e brilhou no último ao, após descobrir que estava sendo
traída novamente, agora pelo novo marido, e, o mais cruel, com a própria filha,
assinou o veredicto cometendo o suicídio e desmascarou de vez todos que estavam
à sua volta.
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