A primeira temporada do “MasterChef Profissionais”, que
terminou na terça-feira (13), teve um impacto maior do que talvez a Band
previsse ao decidir lançar essa versão inédita do “MasterChef” que
tradicionalmente reúne cozinheiros amadores. A questão mais polêmica levantada
desde a estreia há três meses, com 14 concorrentes, foi o comportamento
machista que há no meio e que ainda não havia sido mostrado tão abertamente
diante das câmeras, apesar da quantidade cada vez maior de programas de
culinária na televisão. E a primeira campeã foi justamente uma mulher, a
paulista Dayse, que à primeira vista não atraiu muito a simpatia do público mas
aos poucos foi ganhando admiração por sua sinceridade e simplicidade e
surpreendendo com suas receitas improvisadas. Enquanto seu adversário na final,
Marcelo, fez uma trajetória inversa, passando do jeito modesto e até tímido
para um comportamento exagerado e exibicionista, o que causou certo incômodo
até entre seus admiradores, apesar de toda sua genialidade, ousadia e técnica
na elaboração dos pratos.
A vitória de Dayse atraiu a atenção até da mídia
internacional, que chamou a paulista de “heroína feminista”, enquanto Marcelo,
também paulista e de origem libanesa, incomodado e inconformado com a derrota,
declarou à imprensa nacional que “brasileiro gosta de fracos e oprimidos”. A
frase não foi feliz, mas é preciso reconhecer que Marcelo não foi o
representante maior do machismo evidenciado no programa. Talvez sua
característica mais forte mesmo seja mesmo o espírito acirrado de competidor
que não admite perder para ninguém, seja homem ou mulher, e o deixa obcecado
pela vitória. Não se pode, porém, fazer o mesmo tipo de defesa em relação a
Ivo, que usava seus 25 anos de experiência como justificativa para se sentir
superior a todos.
Logo nos primeiros episódios, o veterano já mostrou
sua visão machista ao ser chamado para ajudar Priscylla em uma prova em grupo e
ter deixado a participante totalmente desestruturada emocionalmente por sua
forma agressiva de tratá-la como se ela fosse sua subordinada. Em uma prova
mais recente, Ivo chegou a mandar Dayse varrer o chão, enquanto ele dominava a
condução da cozinha. A calma como ela reagia às provocações era consequência de
sua própria experiência e por já conhecer o temperamento do ex chefe. Elegância
que ela demonstrou também à provocação de João, que gritou um “Vai, gordinha”,
do alto do mezanino, justamente enquanto ela cozinhava durante a final, para
tentar desestabilizá-la. Aliás, se houvesse troféu para os mais rejeitados do
programa por seus comportamentos, João e Ivo seriam fortes concorrentes. Priscylla
correria por fora como candidata a bibelô fora da casinha (ou seria fora da
cozinha?), já que não conseguia preparar um prato sem pedir ajuda aos colegas.
E ao ser eliminada num programa no qual um preconceito maior falava mais alto, disse
que era sua beleza que incomodava.
O que ficou claro nessa versão inédita do MasterChef
é que a competição entre profissionais pode acabar indo além da simples disputa
culinária e desencadear também uma batalha paralela de egos. Ali não são pessoas
com outras profissões que resolveram arriscar como cozinheiros amadores e
talvez mudem o rumo de suas vidas para começar a investir em culinária. Ali são
profissionais que estudaram gastronomia, têm formação e prática em cozinhas
renomadas e se comportam com certo grau de auto suficiência e confiança que não
fazem parte do perfil de novatos. Até Ana Paula Padrão sentiu essa diferença
durante a entrevista que fez com João, quando o professor foi eliminado e a
chamou de “leiga”. Na gravação da prova final, a apresentadora não perdeu a
chance de fazer referência à forma como foi chamada pelo participante. Ou seja,
até o ego da jornalista ficou mexido.
Por falar em gravação da final, a emissora aprendeu
a lição e parece ter deixado de lado definitivamente a ideia de fingir um ao
vivo quando a parte mais importante do programa, que é a prova entre os dois
finalistas, foi realizada previamente. Tiveram inclusive o cuidado de fechar a parte
gravada com uma mensagem emocionada de Ana Paula, dos três jurados, Érick
Jacquin, Henrique Fogaça e Paola Carossela, e dos dois finalistas, Dayse e
Marcelo, sobre a jornada de todos nessa competição.
E no último bloco Paola se superou em seu discurso* antes
do resultado ao vivo, “Você escolheu uma profissão que
ainda é dominada pelos homens. (...) Às vezes, a gente tem que ouvir umas
idiotices que eu vou te falar, né?”, afirmou Paola. Acima e além de qualquer
tipo de preconceito ou machismo, o que faltou mesmo a Marcelo na final foi
educação. Ele foi extremamente deselegante ao nem ao menos parabenizar a
adversária pela vitória. Dayse foi quem lhe estendeu a mão para cumprimentá-lo
por estar ali com ela na final. Se não lhe cabe o título de machista, cabe o de
mau perdedor. E quem não sabe perder não merece vencer.
*Discurso de Paola:
“Assim
como eu, assim como Ana, você escolheu uma profissão que ainda é dominada pelos
homens e eu acredito que assim como foi para mim e para outras mulheres não
tenha sido nada fácil. Às vezes, a gente tem que ouvir umas idiotices que eu
vou te falar, né? Mas o bom é que você que está aí, e isso quer dizer muitas
coisas. Você não está aí por ser mulher, você está aí por ter um talento
inacreditável e por cozinhar bem pra caramba. Nós jurados não vemos gênero, nem
cor, nem religião, nem cintura, nem altura, nem se é simpático ou se não é, nós
vemos pessoas e nosso trabalho é julgar pratos. Pratos que nos surpreendam
porque têm autenticidade, criatividade, sabor e alma. A sua comida tem tudo
isso. Você hoje pode ganhar ou não, não importa, mas você já ganhou uma coisa
que talvez você não saiba, mas abriu os olhos para nós, eles, o país ou o mundo
inteiro para começar a olhar sem gênero, sem gênero, com características diferentes, dois cozinheiros incríveis, parabéns aos dois”.
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