Há duas semanas no ar, “Além do Tempo”, novela das
seis da Rede Globo, vem mostrando a cada capítulo um esmero tão grande que a
expectativa sobre o que virá na cena seguinte se repete desde sua estreia, no
dia 13 desse mês. Independentemente de se tratar de uma história que, numa
primeira fase, é de época, os acontecimentos se sucedem com mais agilidade do
que em muitos folhetins modernos nos quais as mesmas situações se repetem
exaustivamente. Na novela de autoria de Elizabeth Jihn, a soma dos fatores só
altera o produto para melhor, afinal, trata-se de um produto em que a entrega
de cada ator a seu personagem é sentida pelo telespectador de forma tocante; a
pesquisa refinada que envolve direção de arte, fotografia, cenografia, figurino
e caracterização é percebida nos mínimos detalhes, e o conjunto é valorizado
pelo trabalho sensível da direção geral que tem à frente Pedro Vasconcellos e
núcleo de Rogério Gomes.
O enredo, que traz nuances relacionadas ao
espiritismo, poderia ser considerado pueril, não estivesse recebendo um alto
padrão de qualidade: é a história de um amor impossível entre uma jovem pobre,
Lívia (Alinne Moraes), e o nobre Felipe (Rafael Cardoso), sobrinho-neto da
poderosa Condessa Vitória (Irene Ravache) e noivo de Melissa (Paolla Oliveira),
uma megera e ambiciosa alpinista social da época. O grande segredo está no fato
de Lívia ser a neta bastarda da Condessa, que nem sabe da existência da moça e
nutre um ódio mortal pela ex-nora, Emília (Ana Beatriz Nogueira). Em uma
segunda fase, um século à frente, os personagens voltarão à vida reencarnados nos
tempos atuais, mas com mudanças em suas personalidades e condições social.
Quer dizer, isso é o inicialmente previsto já que
mudanças já começaram a serem feitas atendendo a aceitação do público traduzida
pela boa audiência. A mais significante foi o fato de Emília, em mais uma
interpretação impecável de Ana Beatriz Nogueira, que morreria no capítulo 11,
que foi ao ar nessa sexta-feira (4), ganhar uma sobrevida graças a um terço que
lhe foi entregue por um “Anjo” no seu leito de morte. Com isso, estão
garantidos novos embates entre ela e a onipotente Condessa, também
brilhantemente defendida por Irene Ravache. Um duelo de titãs escrito e interpretado
com um talento e uma entrega arrebatadora, digna de folhetins de outros tempos.
E que faz falta nas novelas atuais.
Além das duas atrizes que respondem pelas cenas mais
contundentes, vale ressaltar a atuação de Nívea Maria, como a rígida e
subalterna governanta Zilda, a transformação de Luiz Carlos Vasconcelos,
causando indignação como o capataz Bento, e o tom de comédia comedido de Inês
Peixoto, que à frente da engraçada família Pasqualini dá um toque especial a
sua Salomé. E também destacar a escolha das locações nas cidades de Bento
Gonçalves, Garibaldi e São José dos Ausentes, na Serra Gaúcha, onde foram
gravadas sequências belíssimas mostrando a tradicional Festa da Colheita da
Uva.
O grande desafio de
todos os envolvidos na realização dessa novela será realmente no momento de fazer
a passagem de tempo, sem perder todos os votos de confiança que já foram conquistados
nessa primeira fase. É preciso lembrar que a nostalgia bate sempre forte em
histórias que sofrem mudanças drásticas nas épocas em que são ambientadas.