Sexo, drogas, traições, traumas, segredos, maracutaias...
Com esses ingredientes, a primeira semana de “Felizes Para Sempre?”, minissérie
da Rede Globo que estreou na segunda-feira passada, 26 de janeiro, obteve uma
audiência tão satisfatória que a emissora promoveu até uma maratona no fim de
semana, exibindo os cinco episódios na íntegra através de seu site oficial. A
história, de autoria de Euclydes Marinhos, é uma releitura de “Quem Ama Não
Mata”, outra série escrita pelo mesmo autor e exibida em 1982 em 20 capítulos.
Mas, se na anterior os conflitos atingiam cinco casais distintos, agora eles são
quatro e fazem parte de uma mesma família. Alguns temas são recorrentes, como esterilidade,
falta de diálogo, mentiras, violência... A forma de retratá-los é que mudou,
seguindo os novos tempos e a maneira como cada um lida com suas questões
íntimas. E o autor está mexendo com o imaginário do público ao expor questões
que poderiam ser consideradas tabus, se não fizessem elas parte da realidade
moderna.
Prevista inicialmente para ser ambientada em Niterói
(RJ), o autor acertou ao levá-la para Brasília (DF), cenários pouco explorados
e que só corroboram para as tramas em que prevalece a sede de poder em todas as
esferas. Enrique Diaz, no papel de Cláudio, o rico empresário envolvido em negociatas
políticas, vive um momento singular em sua trajetória na televisão, marcada até
então por personagens na maioria das vezes apenas sérios ou mal encarados e que
não lhe permitiam discorrer pelo universo da sedução. O ator está provando que
merecia essa chance há tempos.
Sensação dos primeiros episódios, Paolla Oliveira
reforça sua vocação para protagonista interpretando várias mulheres em uma só, como
a garota de programa de luxo Danny Bond, ou apenas Denise. A atriz está
esbanjando sensualidade em cenas extremamente eróticas. Mas é preciso ressaltar
também que o apelo do público também foi muito resultado da bissexualidade da
personagem, que tem uma namorada, mas também transa com homens e suas mulheres.
E acaba se apaixonando por Marília, mulher de Cláudio, que vive um casamento
decadente, sem diálogo, sem sexo, e está sendo brilhantemente interpretada por
Maria Fernanda Cândido. É preciso todo um trabalho interior de composição para
encarnar uma restauradora de arte, recatada pela educação em colégio de freiras,
passou pelo trauma de perder um filho de 5 anos afogado na piscina de casa e, a
partir daí, viu seu relacionamento com o marido literalmente naufragar. Justiça
seja feita, Maria Fernanda merece destaque por mostrar com serenidade a batalha
que sua personagem trava consigo mesma na tentativa de desabrochar para uma
nova realidade.
Da mesma forma vale destacar a interpretação de Selma
Egrei, defendendo com elegância os desejos da professora Norma, uma mulher na
terceira idade casada com um ex-delegado, Dionísio (Perfeito Fortuna), e
cortejada por um rapaz bem mais jovem do que ela. Assim como o trabalho de João
Miguel como Hugo, um engenheiro viciado em sexo que não concorda com as
falcatruas de seu cunhado Cláudio, busca refúgio para suas frustrações na bebida
e ainda descobre que é estéril e, portanto, não é o pai biológico do filho que
tem com sua mulher, Norma, a cirurgiã plástica que faz de tudo para ascender
profissionalmente, vivida por Adriana Esteves. O ator, que recentemente protagonizou
a série “A Teia” como o delegado Jorge Macedo, também vem mergulhando fundo e
com talento no drama pessoal desse novo trabalho.
O roteiro de Euclydes Marinho, escrito em parceria
com Denise Bandeira, Ângela Carneiro e Márcia Prates, é impecável. Em muitas
cenas, as personagens não precisam nem de texto: elas falam através apenas do
gestual. Feito conseguido também graças ao trabalho de direção, dividida por
episódios entre Fernando Meirelles, Paulo Morelli, Luciano Moura e Rodrigo
Meirelles. E o resultado final conta ainda com o excelente trabalho de direção
de arte, fotografia e iluminação.